Síndrome de Burnout na Enfermagem
Dentre os profissionais da saúde e até mesmo dentre outras profissões, a enfermagem é uma das profissões mais atarefadas e desgastantes. Garantir o bem-estar e a eficácia do tratamento do paciente, fazer a correta administração dos medicamentos, ser o elo entre o paciente e sua família, médicos e farmacêuticos, fazer o possível com poucos equipamentos e recursos, longos turnos com horas extras...
Essa rotina estressante cobra um preço muito alto dos enfermeiros que, em detrimento aos cuidados com a saúde dos pacientes e a rotina hospitalar, acabam por negligenciar a própria saúde mental. Durante a COVID-19, esse cenário se agravou, uma vez que os enfermeiros estavam e continuam na linha de frente no combate à doença causada pelo SARS-CoV-2.
De acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), o Brasil conta com 2.587.979 enfermeiros entre graduados, técnicos ou auxiliares. No entanto, o portal Tua Carreira, especializado em mercado de trabalho, colocou a Enfermagem no top 20 das carreiras mais estressantes do mundo. O excesso de estresse na atividade laboral pode levar a uma condição denominada Síndrome de Burnout.
O que é a Síndrome de Burnout
Em tradução livre, a palavra de origem inglesa significa “combustão completa” ou “esgotamento”. As duas definições estão corretas uma vez que o Burnout é uma síndrome consequente do esgotamento físico e/ou mental após longos períodos de trabalho e estresse, que pode (ou não) resultar em um surto de raiva.
Para se ter uma ideia da gravidade, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alterou o significado da Síndrome de Burnout: no Código Internacional de Doenças 10 (CID.10) a doença era tida como um problema na saúde mental e um quadro psiquiátrico; no CID.11, que entrará em vigor em janeiro de 2022, a doença passa a ser descrita como “estresse crônico de trabalho que não foi administrado com sucesso”.
Entre os sintomas físicos estão: dor de cabeça frequente, dores musculares, cansaço e fraqueza, problemas gastrointestinais, e batimentos cardíacos irregulares. Já entre os sintomas cognitivos e psicológicos estão: dificuldade de concentração; sentimentos constantes de fracasso, insegurança e incompetência; alterações repentinas de humor e isolamento.
Demais sintomas compreendem alterações ou falta de apetite, insônia, e falta de esperança ou perspectiva de futuro. Familiares e amigos podem ser grandes aliados no combate à síndrome e devem ficar atentos caso a pessoa manifeste muitos dos sintomas e expresse-os em frases como “não aguento mais” ou “quero sumir”.
O diagnóstico é feito por um psiquiatra mas um psicólogo também pode ajudar na identificação da doença. O tratamento geralmente é feito com psicoterapia e, em alguns casos, com a prescrição de medicamentos antidepressivos e ansiolíticos.
Estudo de caso
A seguir, veja um estudo realizado em hospitais dos Estados Unidos entre 2013 e 2017 e originalmente publicado no American Journal of Critical-Care, um periódico da American Association of Critical-Care Nurses.
Cenário
Enfermeiros com atuação em unidades de terapia intensiva (UTI) têm uma taxa de burnout entre as mais altas de qualquer campo da enfermagem. O esgotamento desses profissionais pode afetar a qualidade do relacionamento com médicos, farmacêuticos e pacientes. Poucos estudos consideraram como os padrões temporais podem influenciar os resultados.
Objetivo
Testar um modelo longitudinal de grupos de burnout e associações com resultados de pacientes e médicos.
Métodos
Um estudo observacional analisou dados de pesquisas anuais com funcionários e dados administrativos sobre os resultados clínicos de pacientes em 111 unidades de terapia intensiva da Veterans Health Administration (Estados Unidos) de 2013 a 2017.
As taxas de esgotamento a nível local de enfermeiros de cuidados intensivos foram calculadas a partir de respostas de uma pesquisa sobre exaustão emocional e despersonalização.
Uma análise da trajetória latente foi aplicada para identificar grupos de instalações com padrões de esgotamento semelhantes ao longo de 5 anos. Uma análise de regressão foi usada para analisar os resultados dos pacientes e funcionários por grupo de burnout e medidas de contexto organizacional.
Resultados de interesse incluíram resultados de pacientes (taxa de mortalidade padronizada de 30 dias e tempo de internação menor que o esperado) de 2016 a 2017 e resultados clínicos (intenção de deixar e satisfação do funcionário) de 2013 a 2017.
Resultados
Uma análise longitudinal revelou 3 grupos de burnout entre os 111 locais: burnout baixo (n = 37), médio (n = 68) e alto (n = 6). Em comparação com as unidades no grupo de baixo desgaste, as do grupo de alto burnout têm estadias mais longas de pacientes, maior intenção de rotatividade de funcionários e menor satisfação dos funcionários em modelos bivariados, mas não em modelos multivariados.
Conclusões
Neste estudo em locais variados e em vários anos, o esgotamento dos enfermeiros de cuidados intensivos foi associado aos resultados clínicos e de pacientes. Os esforços para lidar com o esgotamento entre os enfermeiros podem melhorar os resultados dos pacientes e funcionários.
Leia o estudo na íntegra: “Critical-Care Nurse Burnout in Veterans Health Administration: Relation to Clinician and Patient Outcomes”.
Dicas para cuidar da saúde mental na Enfermagem
Confira, a seguir, algumas recomendações da American Medical Association para manter um bom desempenho sem perder a cabeça:
1. Fique à vontade para sentir e expressar sentimentos
A pressão intensa devida ao aumento potencial nas demandas de cuidados, risco de infecção e falta de equipamento, entre outros fatores de estresse são inerentes ao exercício da enfermagem. Experimentar o estresse e os sentimentos associados a ele não são de forma alguma um sinal de fraqueza ou um reflexo da capacidade de realizar o trabalho. Desabafar com amigos, familiares ou algum colega de trabalho que entenda a sua rotina; se necessário, não descarte buscar a ajuda de um psiquiatra ou psicólogo.
2. Empregue intencionalmente estratégias de enfrentamento
Coloque em prática estratégias que funcionaram para você em épocas de estresse. Isso pode incluir descansar o suficiente e encontrar tempo de folga durante o trabalho ou entre os turnos, fazer refeições sadias e em um horário definido, praticar atividades físicas e manter contato (com distanciamento social apropriado) com a família e amigos.
3. Faça “auto-check-ins” regulares
Monitore-se quanto aos sintomas de depressão ou transtorno de estresse, como tristeza prolongada, dificuldade para dormir, memórias intrusivas e sentimentos de desesperança. Fale com um colega ou supervisor de confiança. Esteja aberto para procurar ajuda profissional se os sintomas persistirem ou piorarem com o tempo.
4. Dê uma pausa nas notícias e redes sociais
Crie o hábito regular de se afastar do computador e do smartphone de vez em quando. Ao retornar online, concentre-se nas informações de fontes confiáveis, não apenas nas fontes de seu feed de mídia social. Você não precisa absorver tudo o que é produzido por um ciclo de notícias 24 horas nos sete dias da semana. Além disso, um estudo recente mostrou que as redes sociais podem agravar os sintomas depressivos.
5. Fortaleça-se e sempre lembre do valor que tem o seu trabalho
Lembre-se de que, apesar dos desafios e frustrações atuais, cuidar dos mais necessitados em um momento de grande incerteza e riscos é uma vocação nobre. Certifique-se de reservar um tempo para reconhecer não só os seus esforços e sacrifícios, mas também os dos colegas de trabalho, criando uma corrente do bem.
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